sábado, 6 de junho de 2009

Metallica - Entrevista de Hetfield na Classic Rock - Parte II

Classic Rock: Você estava feliz de ver Dave Mustaine pelas costas?




Hetfield: Eu não sei se "feliz" é a palavra certa, mas era necessário. Teria eu, Lars e ele todos tentando liderar e isto seria uma confusão triangulada. É óbvio que ele queria o mesmo caminho que nós - ele continuou a fazer óptimas coisas nos Megadeth. Da maneira que as coisas estão hoje, as dinâmicas de carácter, Lars e eu somos metade da escala com o Rob e o Kirk sendo a outra. Eles são pessoas de óptimas ideias, mas muito boas em deixar alguém liderar. É preciso disso, eu acho. Eles não ligam para o ego e o Lars e eu somos o contrário, parece. Isso que me disseram [risos]. Então naquela época, Dave tinha que ir.






Classic Rock: Em Some Kind of Monster, ele parece mesmo infeliz com isso.




Hetfield: Ele é uma pessoa incrível, talentosa. Talvez parte de seu carácter seja só ter esse peso nas suas costas. Se eu fosse expulso dos Metallica, eu também teria. Ron McGovney, nosso primeiro baixista - peso muito grande nas suas costas. Eles não são capazes de realmente estar confortáveis com o agora, e é difícil de ver. O Lars também disse isso na entrevista: "Você não vê o que você fez?" Mas nada disso importa porque ele está buscando algo inalcançável.






Classic Rock: Passar pelo falecimento da sua mãe tornou a morte de Cliff mais fácil?




Hetfield: Nunca é fácil. Você não se acostuma com isso, especialmente naquela idade, e a mentalidade que eu tinha, beber tanto para afogar qualquer sentimento... Essa era outra parte da Ciência Cristã: não havia funerais, período de luto onde você poderia chorar e ser amparado. Era simplesmente: "Ok, o recipiente está morto, o espírito se foi e prosseguiu a vida". Então quando Cliff morreu houve um funeral, mas eu não senti o sentimento. Eu só bebi mais. Bebi para esquecer.






Classic Rock: O Lars disse que antes do acidente, você e o Cliff se tornaram próximos, e um dos efeitos da tragédia foi que você e o Lars se tornaram próximos depois disso. Você concorda com isso?




Hetfield: Sim. O Cliff e eu realmente nos identificávamos um com o outro. Nós gostávamos muito das mesmas coisas. Mesma música - ele curtia mais Southern rock, Lynyrd Skynyrd, coisas desse tipo, que eu amo. Ele amava estar solto na natureza, fazer trilhas, acampar para caçar, beber cerveja. Ele e eu nos identificávamos um com o outro.






Classic Rock: O que você mais se lembra sobre o acidente em que ele morreu?




Hetfield: Era tão frio. Nós estávamos na Suécia no inverno. Eu dormiria no banco de trás para que pudesse ser um pouco mais quente. Eu estaria ao lado dele. Sabe, eu não penso nisso. É o que é. Nós sobrevivemos por alguma razão para continuar. Nós certamente sentimos a falta do Cliff. Tantas coisas poderiam ter sido diferentes.






Classic Rock: Você acha que entraram em digressão de novo muito rápido depois da morte de Cliff?




Hetfield: Eu acho que nós fizemos tudo muito rápido depois disso. Conseguir um baixista, entrar em digressão. Nós voltamos directo. Essa foi a forma da gerência lidar com o pesar: "só toque através da sua música". Agora parece como se não tivesse tido pesar o suficiente ou respeito o suficiente, e o suficiente de lidar um com o outro e ajudar um ao outro a superar. Nós voltamos a estrada e descontamos muito disso no Jason [Newsted] assim que ele entrou. Era mais como: "sim, nós temos um baixista, mas ele não é o Cliff".






Classic Rock: Você gostava do Jason?




Hetfield: Sim, eu gostava do Jason. Havia um sentimento realmente positivo nele. Estilo criança, mas não infantil. As coisas que nós gostávamos, as coisas que curtimos, compor juntos, foi divertido. Então começou a crescer a fama, alguns ressentimentos foram criados e as coisas mudaram para todos nós.






Classic Rock: Lars declarou que um possível título para o disco de 1988 "...And Justice For All" seria "Wild Chicks, Fast Cars And Lots Of Drugs" ["Muidas Selvagens, Carros Velozes e Muitas Drogas"]. Isso era um retrato preciso da banda naquela época?




Hetfield: Bem, nós todos tivemos as nossas batalhas, todos tivemos imoralidades que estavam a crescer monstruosamente, sabe. Sim, nós estávamos lutando contra demónios. Num ponto, transformou-se de diversão em destruição. Começou a nos dominar. Justice estava a começar. Nós tínhamos terminado o "Master of Puppets", saído em digressão com o Ozzy e começávamos a tocar o nosso próprio som. As coisas estavam a dar certo e coisas se tornaram disponíveis - mulheres, festas, chame o que quiser. Nós ficamos envolvidos nisso. Era como era para ser. Naquela época, sabe, eu não sei quem de nós era casado, mas eu com certeza não era, então estava tudo certo. Nem tanto para as namoradas esperando-nos em casa mas, sabe, são coisas que você tinha que fazer quando criança como um aprendiz. Era divertido. Você tem que fazer tudo isso para descobrir que 'bem, isso não faz parte da música'. Era como uma faixa bónus, mas começou a tomar conta de todo o disco, sabe? [risos]






Classic Rock: Usar drogas não te interessou, então?




Hetfield: Graças a Deus não me interessou. Eu tinha medo de drogas. Talvez por causa da Ciência Cristã, mas também, no colégio, a minha primeiríssima banda - apropriadamente chamada Obsession - eu me lembro de ter usado erva e pensado: "Uau, isso é óptimo". Então eu fumei cinco uma noite, fui tocar e meu, apanhou-me muito. Eu pensei que estávamos a tocar a mesma música por meia hora. Não gostei.






Classic Rock: Como era o Lars quando usava cocaína?




Hetfield: Ah, meu. Tagarela? Mais ainda, se isso é possível. A merda de sempre. Eu não gostava de ficar perto deles quando eles usavam isso.






Classic Rock: Você era divertido quando estava bêbado?




Hetfield: Definitivamente não. Eu ficava muito violento. Tinha o momento feliz, mas a coisa ficaria feia onde o mundo está fodido e fode você. Eu virava... o palhaço e então o punk anarquista, querendo esmagar tudo e aleijar pessoas. Eu entraria em brigas. Com quem? Às vezes com o Lars. É assim que os ressentimentos eram liberados, empurra empurra, atirando objectos a ele. Nós tínhamos dois tipos de personalidade diferentes. Muito diferentes. Ele quer ser sempre o centro das atenções e isso me incomoda porque eu também sou assim. Ele está lá, encantando as pessoas enquanto eu as intimidarei para que elas me respeitem assim.






Classic Rock: Isso ainda é verdade?




Hetfield: Não. Eu acho que aprendi a desligar isso. Aquela parte minha me incomodaria tanto, porque nós éramos essa banda que era tão anti-Los Angeles, anti-Hollywood, não sendo poser, apenas faça, e ele estava lá, sendo um poser. Guns N' Roses era, pra mim, como parte do inimigo. Lars estava lá, com jaqueta de couro branco, fazendo pose. Lars é desse jeito, ele irá envaidecer-se com algumas certas pessoas na vida dele e precisa entrar nelas. É apenas uma parte dele, eu acho. Ele gosta de aprender com pessoas que tenham isso. Axl tinha.






Classic Rock: Foi difícil gravar "Nothing Else Matters"?




Hetfield: Não. No começo foi. Eu não queria nem tocá-la pra eles. Era tão sincera, tão pessoal pra mim. Eu achava que os Metallica poderiam apenas ter músicas sobre destruir coisas, bater a cabeça, sangrar para a multidão, o que quer que fosse, contanto que não fosse sobre garotas e carros potentes, mesmo que gostássemos disso. A música era sobre uma garota, uma namorada na época. Estava apenas começando a ser capaz de expressar outros sentimentos. Eu certamente não achava que era uma música dos Metallica. Quando eles ouviram eles ficaram impressionados , eu acho, relacionaram à banda. Acabou sendo uma grande e bela música naquele álbum.






Classic Rock: Era como um grande ponto de mudança?




Hetfield: Eu diria que sim. Aquilo abriu ainda mais a porta e nos deu carta branca para tocar muitos estilos diferentes de musica. Tocou muita gente.






Classic Rock: O que você lembra a respeito da turnê de 1992 com os Guns N' Roses?




Hetfield: Meu, foi uma turnê excedente: "ei, voces vai no pós-festa?" Axl gastanto milhares de dólares nessas festas. Era muito extravagante, o que não tinha nada a ver comigo. As banheiras no backstage. Eu voltaria e beberia a cerveja deles e jogaria bilhar, era isso que eu fazia. Quando eles saíssem do palco, eu já teria ido, então não precisava sair com eles.






Classic Rock: Você se desenvolveu como esse reservado gigante.




Hetfield: Muito disso tinha a ver comigo provando minha masculinidade pra mim mesmo. Muitas das coisas que eu senti que meu pai não me ensinou, como mexer com carros, caçar, sobreviver. Coisas desse tipo. Eu realmente senti que eu tinha que ir e aprender essas coisas e provar a mim mesmo que eu estou bem, que eu posso fazer isso. Meu pai era assim.






Classic Rock: Você ainda caça?




Hetfield: Atualmente não me parece necessário, matar coisas só por matar. Eu não sou contra caçar mas não parece mais tão necessário quanto andar a 150 milhas por hora num carro [risos].






Classic Rock: O que mudou o seu pensamento?




Hetfield: Nós fomos caçar - isso foi pouco antes de eu ir para a reabilitação quando eu pisei feio na bola - na Sibéria. Eu tinha uma mulher e flhos em casa: "até mais, eu estou indo para Sibéria". Eu fui na península de Kamchatka, caçar ursos cinzentos em motos de neve em quatro pés de neve. Se você cai da moto, está acabado. Eu vi uma pegada de urso e parecia bem humano para mim. Eu vi algo nisso que não fazia muito sentido para mim. Nós estávamos nessa cabana no meio do nada, a quatro horas de helicóptero dessa cidadezinha de merda. Beber vodka - não havia mais nada pra beber. Isso foi o fim pra mim.






Classic Rock: Você estava desconfortável com a nova imagem da banda para o "Load"?




Hetfield: Com certeza. O Lars e o Kirk lideraram esses discos. Todo o tópico "nós precisamos nos reinventar" estava de pé. A imagem não é algo ruim para mim, mas se a imagem não é você, então não faz muito sentido. Eu acho que eles buscavam na verdade uma vibe estilo U2, Bono fazendo seu alter ego. Eu não conseguia entrar no clima. Todo o tipo de "ok, agora nesta sessão de fotos nós seremos roqueiros glam dos anos 70". Tipo, o que? Eu diria que metade - pelo menos metade - das fotos que estão no livreto, eu me livrei. Todo o negócio da capa, era contra o que eu sentia.






Classic Rock: O que você não gostou da capa?




Hetfield: [Risos] Como eu posso dizer? Eu acho que quando eu falei sobre ressentimentos de ser deixado de fora dos laços que eles tinham através do uso de drogas - Lars e Kirk curtiam bastante arte abstrata, fingindo serem gays. Eu acho que eles sabiam que me incomodava. Foi uma afirmação para tudo isso. Eu amo arte, mas não para chocar os outros. Eu acho que a capa de "Load" foi só uma provocação disso tudo. Eu fui com essa coisa de maquiagem e todas merdas loucas, estúpidas que eles sentiam que precisavam fazer.






Classic Rock: Muito foi dito sobre os cortes de cabelos na época. Isso foi uma decisão do grupo?




Hetfield: [Risos] Não foi tipo nós irmos todos e então, "ei, nós conseguimos um desconto por quatro cortes?" Simplesmente foi acontecendo devagar, com a idade, cabelos mais ralos. Cabelos longos não parecia mais certo.






Classic Rock: Musicalmente, essa foi a primeira vez que os Metallica estiveram incertos?




Hetfield: Eu diria que sim. Aquele período todo. Por que nós precisamos nos reinventar? Muitos dos fãs se desanimaram muito com a música, mas principalmente, eu acho, pela imagem.






Classic Rock: Você se sentiu incomodado com Kirk e Lars beijando-se nas fotos?




Hetfield: Totalmente. E é por isso que eles fizeram isso. Eu sou a força por trás das aventuras homossexuais deles. Eu acho que as drogas tinham alguma coisa a ver com isso também. Eu espero. [Risos] Tiveram várias vezes na nossa carreira que as pessoas pularam fora, e isso vai acontecer. É mais doloroso ouvir, "ok, estão a partir discos dos Metallica porque eles estão processando o Napster".






Classic Rock: Parece que o Lars liderou esse negócio do Napster.




Hetfield: Ele é o porta-voz da banda. Ele gosta de falar, ele gosta de estar por aí. Eu sou extremamente orgulhoso pelo que a gente fez. Tinha que acontecer. Nenhum artista se levantaria, exceto alguns artistas de rap. Nos estávamos abandonando a atitude rebelde e, meu, não poderia haver algo mais rebelde que isso.






Classic Rock: Na entrevista de 2001 para a Playboy, você disse que o Lars é um baterista ruim.




Hetfield: Ele admitirá isso. Eu não sou um vocalista muito bom, mas algo acontece quando nós tocamos juntos.






Classic Rock: Você viu a terapia como algo não-macho?




Hetfield: Com certeza. Até o [produtor] Bob Rock introduzir um pouco de tempo para meditar antes de tocar, "sem chance! Vão se foder. Vocês perderam a cabeça? Vamos só detonar!" Eu não estava aberto a isso.






Classic Rock: Você mudou de idéia?




Hetfield: O meu grande acordar. A esposa me mandou para fora de casa. Minha esposa disse: "você não voltará até que deixe isso e faça alguma terapia. Não só beber, mas todas as outras merdas que vem com isso, sabe. O desrespeito, fazer o que você quer quando você quer". Eu tinha que crescer. Eu tinha uma família.






Classic Rock: Quando foi isso?




Hetfield: Isso foi durante o "St. Anger". Nós estávamos começando a compor no Presidio [ex-base militar]. Então, em certo momento da terapia, eu percebi como a minha vida estava fodida. Quantos segredos eu tinha, quão incongruente era a minha vida, e mostrando todas essas merdas para minha esposa. Merdas que aconteciam na estrada.






Classic Rock: Mulheres?




Hetfield: Ah sim. Mulheres, bebedeiras, o que for. Isso trouxe muito medo para os outros, sabe [risos]. Tipo eu sou essa pessoa que se vangloria disso e de repente: "uau, não é terrível, querido, que ele tenha feito isso? Você não faria algo assim, não é?" "Oh, claro que não!" Isso deixaram as coisas pretas - e já estavam ruins naquela época. Eu acho que foi a parte salvadora dos Metallica, não há dúvida. Tinha que ter um fim de algum jeito. A minha esposa levantou-se e me disse: "Ei, eu não sou uma dessas suas 'sim senhor' da estrada. Cai fora."






Classic Rock: Qual foi sua reação?




Hetfield: Minha vida acabou, primeiro de tudo. Medo é um grande motivador e isso me motivou, ter todos esses problemas com abandono e perder um grupo, perder pessoas na minha vida.






Classic Rock: E parecia que você iria perder a sua banda e o seu casamento.




Hetfield: Os dois ao mesmo tempo. Então foi: "eu preciso juntá-los ou eles irão embora, e então o que farei?"






Classic Rock: Quando você voltou?




Hetfield: Minha esposa estava grávida de nosso terceiro filho. Ela é minha anjinha - Marcella. Minha esposa precisava de mim lá e eu fui capaz de estar lá no nascimento, o que foi incrível, e cortar o cordão e todas esses laços. Sim, minha filha basicamente nos uniu de volta.






Classic Rock: O que você acha do "St. Anger" agora?




Hetfield: Foi mais uma afirmação do que uma peça musical de trabalho. Nós tínhamos que fazer o "St. Anger". O Phil Towle, [o terapeuta] ele disse: "todo esse trabalho que vocês estão a fazer agora não é para este disco, é para o próximo".






Classic Rock: Bob Rock ficou chateado quando vocês decidiram que Rick Rubin produziria o "Death Magnetic"?




Hetfield: Espero que sim. Não de forma mesquinha. Nós ambos sabemos que ficou confortável demais, ficou fácil demais, e você precisa explorar. Talvez não houvesse mais tensão. Ele era um quinto membro da banda, uma figura paterna. Talvez nós sentimos medo de que não poderíamos fazer um disco sem ele, mas eu espero que ele sinta falta de nós, porque nós certamente sentimos falta dele.






Classic Rock: Você achou difícil fazer uma digressão sóbrio?




Hetfield: A princípio foi óptimo, mas assustador ao mesmo tempo. Na maior parte do tempo era: "o que eu faço agora?" Mas quantas horas foram perdidas sentadas num bar em algum lugar, falando com pessoas que você nunca mais verá? Então eu fui passear, fazer as coisas que você faria se fosse sua primeira digressão. Os tipos foram bem respeitosos.






Classic Rock: O que você e Lars tem em comum?




Hetfield: Além de crianças e uma vida familiar, nós gostamos muito de arte, embora estilos completamente diferentes de arte. Eu gosto de arte de personalização, arte sacra, fazer coisas para a banda. Ele curte muito arte abstrata. Conclua você mesmo sobre isso.






Classic Rock: Você ama o Lars?




Hetfield: Eu amo. Não há duvida de que nós fomos colocados nessa jornada por uma razão. Nós nos juntamos e, como minha esposa e eu, os opostos se atraem e é uma batalha sem fim. Nós temos essa química que funciona mesmo que ressentimentos entrem no caminho e nós não possamos ver algumas vezes. Há uma agitação, uma fricção, uma faísca que simplesmente acontece.






Classic Rock: Isto é algo que você poderia dizer há 10 anos?




Hetfield: Eu ainda poderia dizer isso naquela época. É um tipo diferente de amor. Nós não colocaríamos nossas famílias juntas e iríamos para o Havaí por uma semana. Mas, meu, quando algo acontece na estrada, alguém está a desafiar os Metallica ou nossa habilidade, nós vamos agarrar a isso como se não houvesse amanhã. Nós vamos nos levantar, cuidar um do outro, e lutar até a morte.

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